sábado, 8 de fevereiro de 2014

Desconceituando #1: Os Conceitos Futuristicos de Her

Her - Spike Jonze - 2013
Her (Ela, no Brasil) é uma visão instigante e interessante sobre vários tópicos. Além do amor "artificial" entre seu protagonista (Theodore, Joaquin Phoenix) e o sistema operacional (Samantha, Scarlett Johansson), Her impressiona por tratar sobre uma gama de assuntos que muitos filmes tentam comunicar e acabam falhando, e entre esses assuntos, está o nosso em questão: O conceito futurístico do filme.
Logo no começo, vemos Theodore comprando um OS (sigla em inglês para sistema operacional) e instalando o mesmo. É assim que ele começa a relacionar-se com o quem ele nomeia como Samantha, seu sistema operacional de impressionante capacidade interpretativa. Desde o começo da era computacional, é um desejo molhado humano falar com suas máquinas e com o aparecimento de sistemas operacionais e algoritmos cada vez mais impressionantes, Her pode ser considerado um filme pé no chão e coerente com nossa realidade atual. Temos três coisas que chamam muita atenção durante o filme, inicialmente. 
A primeira coisa é que Theo (chamemos o protagonista assim, não fique brava Samantha) utiliza-se de seus gadgets com simples comandos por voz e um ponto de saída de áudio eletrônico introduzido na orelha (aqueles que há muito tempo os jornalistas, apresentadores de TV e técnicos de futebol utilizam para receberem informações sem precisar pegar algum aparelho) - isso está começando a ser popularizado hoje em dia. Assim como a Apple fez com a Siri, e a Google com o Google Now e outros por aí, o gadget usado por Theo no filme é altamente eficaz e lê e-mails, traz informações sobre o tempo e todas aquelas firulas que vocês já sabem e estão cansados de saber. 
Porém, casando com nosso primeiro ponto interessante do universo de Her, logo após Theo adquirir sua inteligentíssima OS, percebemos que a mesma consegue se conectar com a maioria de seus aparelhos eletrônicos (vide Apple, Google, Samsung e por aí vai) criando uma única interface relacional entre usuário e aparelho. Assim, Theodore não precisa estar em casa para conseguir falar com Samantha, ele pode simplesmente ligar seu ponto na orelha e sair falando com ela sem tocar em nenhum botão que não seja o aparelho introduzido em sua orelha. Se Theodore quiser ver algo realmente, ele apenas retira um pequeno e fino aparelho do bolso (que devia ter apenas 5 ou 6 polegadas) e checar o que deseja. A liberdade é incrível e traduz o plano evolutivo de qualquer gadget atual: Não ser apenas um aparelho, mas tornar-se parte do usuário.
Estabelecendo tudo isso, o roteirista (Spike Jonze, que também dirige) tem uma deliciosa tarefa pela frente e pôde tratar Samantha como uma pessoa de verdade e ainda por cima explorar seus problemas e questões existencialistas expostas ao decorrer do longa.
O terceiro ponto a analisarmos é o ambiente cuidadosamente estabelecido por Jonze e sua equipe de arte. Cidades ficaram mais limpas, prédios mais altos, a vegetação está em todo lugar contrastando com o concreto das calçadas e a mobilidade não mudou muito, ficou apenas mais prática e acessível. Assim como já é visto em Nova York, em São Paulo e algumas outras metrópoles, o acesso ao metrô por meio de entradas que mais parecem galerias ainda não data o filme, muito pelo contrário, mostra-nos que essa é uma ideia que ainda pode ser aplicada. Her dá o exemplo perfeito de uma sociedade desenvolvida. E por que tanta credibilidade? Porque não vemos, em Her, transito, nem pessoas estressadas por causa de transporte e coisas tão comuns para os cidadãos das grandes metrópoles do mundo atual.


Além de todos esses pontos positivos (sem nem ao menos termos começado a falar sobre direção, elenco e roteiro - coisa que não é a intenção desse texto) podemos ainda analisar como o próprio ser humano é tratado durante a trama. 

Os humanos parecem ter atingido uma capacidade interativa muito maior. Na trama, com a tecnologia em evidencia, as relações interpessoais, sem o uso de nenhuma firula eletrônica para comunicação, parecem ser bem mais prazerosas e tratarem agora de eventos incomuns. Assim como o que foi mencionado, temos também a comunicação para grandes distancias sem o uso de nenhum aparelho à mão. Talvez seja aí o único pecado do filme, antes de Theodore descobrir a verdade sobre Samantha, não vemos nenhuma pessoa utilizar as mesmas funções de seu aparelho igual Theodore faz e, em contraponto, nenhuma pessoa demonstrando algum estranhamento com um sujeito falando de forma audível e rindo sem culpa. Mas isso não mancha o filme. No final vemos que várias pessoas utilizam a mesma tecnologia que o protagonista utilizava e talvez o Jonze tinha a intenção de evidenciar o quão pessoal e única era aquela experiência para Theodore que ele nem ao menos imaginava que alguém podia estar passando pela mesma coisa.

Esquecendo um pouco essa questão social e tecnológica, outra coisa que chama muita atenção é o figurino dos personagens. As roupas contrastantes e, de certa forma, vintages caem como uma luva  em Theodore. A harmonia criada entre os tons dos tecidos das peças escolhidas e o ambiente em um show de fotografia (pesquise sobre Hoyte Van Hoytema). É magnifico de se ver. Theodore é vestido com peças num vermelho salmão durante sua paixão por Samantha e momentos de descoberta, em tons claros (branco e azul) para momentos contemplativos e lembranças, e tons instigantes e frios (como amarelo claro e roxo) para situações desafiadoras (como o encontro com Olivia Wilde e o encontro com sua ex-mulher, Catherine, interpretada por Rooney Mara).

Assim, muito bem dirigido e conceituado, Her merece o Oscar de melhor roteiro original que concorre com a justíssima indicação, e isso não se deve apenas ao assunto inconvencional, mas também a capacidade de contar uma história estabelecida em cima de pilares próprios e levada a sua maneira, sem preocupar-se com um possível julgamento errôneo por parte daqueles que não verão as entrelinhas dessa história. O protagonista, Theodore, é o mesmo galã que Richard Gere e George Clooney por vezes interpretaram, mas com um roteiro de primeira mão e personagens muito bem feitos, ele pode ser considerado um dos maiores exemplos de passion guy do cinema americano. Depois de vermos zilhões de sci-fi, essa é uma incrível visão sobre um futuro, que talvez não seja o nosso, mas que baseia-se agora na coerência e nas necessidades evolutivas humanas, e não mais tecnológicas.

Por: Danilo Silva, 2014
Colaboração de: Paulo Ricardo Oliveira 

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